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COLUNISTAS / Mundurukando

Uma Fundação Cultural para Lorena?

27/04/2015

Tenho participado de muitos eventos literários e culturais pelo Brasil todo. À maioria deles sou convidado para falar sobre a cultura indígena e sobre meu trabalho com a literatura. Quase sempre há um bom público presente, “arrastado” que é por uma organização qualificada, organizada e profissional. Para quem é convidado, isso é uma grande festa, pois percebe-se que não se trata de um convite sem consequência. 
Por outro lado, há eventos em que participo em que nem sequer sou reconhecido. Nesses lugares percebo que as pessoas acabam realizando ações “domésticas” compostas de muito boa vontade, mas sem profissionalismo. Eu não me nego participar, lógico, mas fico sempre imaginando até quando isso irá acontecer. É que as pessoas que organizam tais programações quase nunca são patrocinadas por entidades ou, pior, pelas próprias prefeituras. 
Como sou curioso, procuro saber os motivos pelos quais as atividades não são mantidas pela prefeitura, através da Secretaria de Cultura. Quase sempre as respostas são as mesmas: há um emperramento da maquina pública. Cutuco mais um pouco. Burocracia, eles dizem. Tudo tem que seguir uma rotina que exige tempo e negociação que não acabam nunca.
Por outro lado, nos eventos mais bem organizados, normalmente há uma gestão que, mesmo estando sob a tutela da prefeitura, consegue ter liberdade para atuar, contratando bons profissionais, qualificados para atuarem nas áreas em que são especializados. O resultado disso é contentamento, alegria, incentivo à leitura, vendas de livros tornando todos os setores que participam mais felizes, envolvidos e comprometidos com a coletividade.
E quem é essa entidade capaz de criar um grau de felicidade assim? Eu lhes digo: quase sempre é uma fundação cultural. E o que é uma fundação cultural? É uma autarquia vinculada ao executivo municipal, responsável pela gestão da cultura local. Ela normalmente não substitui a Secretaria de Cultura, mas acaba sendo o executor da política cultural, pois entre suas competências está a possibilidade de conseguir outros recursos, além daqueles que são destinados no plano orçamentário do município. 
Todos sabemos que a Secretaria de Cultura é uma espécie de “primo pobre” entre as várias secretarias municipais. Não é comum que uma prefeitura jogue todas as suas fichas na formação cultural de seus munícipes. Ao contrário, este é o tipo de investimento que não encontra eco nas propostas de vereadores ou de prefeitos brasileiros. Quase sempre, a cultura recebe uma parcela muito pequena do orçamento municipal. Com estas verbas pequenas, quase nada se pode fazer. Não raras vezes, o titular da pasta tem que recorrer ao governo do Estado para poder oferecer alguma “diversão mais qualificada” ao povo do município.
Uma fundação cultural normalmente rompe com esta lógica. Como ela tem autonomia na gestão de suas ações, pode buscar recursos em outras fontes de patrocínio, qualificando a cultura municipal. Pode, assim, desenvolver projetos que atinjam as várias expressões artísticas: música, literatura, teatro, cinema, artes plásticas, fotografia, folclore, museu e memória. Enfim, ela pode capilarizar a cultura local. Ela não fica escrava da burocracia que emperra os projetos. Consegue alavancar uma série de ações que valorizam o local. Além disso, a Fundação pode e deve valorizar a produção local, gerando postos de trabalho, incentivando a formação de agentes culturais e, principalmente, formando profissionais para o mercado que mais cresce no Brasil e que gera milhões de reais anualmente. A isso se tem dado o nome de economia da cultura.
Pois bem. Se analisamos a situação de Lorena percebemos que a cidade, nos últimos anos, retrocedeu na área da cultura. Não que não houvesse bons eventos, mas pelo fato de que os que eram realizados quase nunca representavam a identidade local. Os gestores, engessados pela máquina administrativa, se viam obrigados a recorrer àquilo que o governo estadual oferecia. O resultado nunca foi satisfatório. Não se formou público e nem profissionais da área. Para mim isso, é o fracasso do modelo municipal de nossa cidade.
Eu irei voltar a esse tema outras vezes ainda. Mas gostaria que pensassem comigo se uma FUNDAÇÃO CULTURAL DE LORENA não seria uma boa alternativa para o crescimento cultural de nossa cidade.
É para pensar.

COLUNISTAS / Daniel Munduruku

Daniel Munduruku é graduado em filosofia e doutor em Educação pela USP(Universidade de São Paulo).

Autor de premiados livros para crianças e jovens, reconhecido nacional e internacionalmente, comendador da Ordem do Mérito Cultural da Presidência da República.  Reside em Lorena desde 1987; é casado com a professora Tania Mara, com quem tem três filhos.


dmunduruku@uol.com.br

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